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Maria Lucas lança seu segundo livro, “Mais uma Casa de Bonecas”, totalmente produzido por pessoas trans

Na segunda parte da Trilogia D´Ela, a autora trans Maria Lucas faz um mergulho nas relações cis-hétero centradas

Após compartilhar experiências vorazes da sua jornada enquanto mulher trans diante da cisnormatividade no livro “Esse Sangue Não é de Menstruação, mas de Transfobia”, a autora carioca Maria Lucas lançará a segunda parte da “Trilogia D’Ela”. O livro “Mais Uma Casa de Bonecas” (Editora Urutau, 56 pgs, a partir de R$25, 2022) está com a pré-venda aberta até o dia 19 de junho e retrata as socializações e contradições de relações familiares entre pessoas cisgêneras e heterossexuais, assim como o empoderamento de corpos trans e LGBTQIA+s  em relações de afeto entre si. 

As histórias contadas nos livros de Maria Lucas são oriundas de vivências da própria escritora que assume o alter-ego de Ela, personagem que escolheu para narrar histórias de violência e expulsão que viveu durante a pandemia, quando morou em dois consecutivos lares com pessoas cisgêneras que a agrediram de diversas formas. A escrita é feita em forma ensaística e busca a construção de uma história de auto-ficção. 

“É um processo de retrabalhar dores e também muito arriscado, por expor situações e pessoas que realmente existiram e existem fora das páginas destes livros. Mas não menciono nomes e faço este trabalho para que compartilhemos essas histórias para, mais do que explicita-las, alertar sobre o quanto precisamos avançar enquanto sociedade. Escrevo sobre o que vivi, mas sabendo que também é sobre a vivência de muitas pessoas trans neste nosso país ultra transfóbico”, diz a autora, que é a primeira pessoa trans a ganhar o concurso de ensaios da conceituada Revista Serrote, do Instituto Moreira Salles, com o texto “Próteses de Proteção”.

O livro ainda conta com orelha da artista, pesquisadora e curadora trans-feminista Hilda de Paulo; e com ilustrações de Íra Barillo, artista visual não-binário que já criou imagens para o primeiro livro da trilogia, compondo assim um projeto totalmente produzido por pessoas trans.

Na escola em que primeiro frequentou na vida, antes mesmo de aprender a ler ou a escrever, logo após aprender a falar, foi como uma pequena estagiária do que seria sua vida em não conformidade com o gênero, grande tabu da vida em sociedade. Uma estagiária que já agia como desajeitada, tortamente uniformizada, devia satisfação a todos: Homens e Mulheres Adultos e as outras crianças que eram como miniaturas desses primeiros, sendo estes Homens e Mulheres Crianças”.

(Trecho do livro “Mais uma Casa de Bonecas”)

No livro, a autora relembra sua infância, expondo como corpos LGBTQIA+, já desde pequenos, estão por fora das dinâmicas sociais do “rosa e azul”, que dividem meninos e meninas, e das tradições antigas relacionadas a gênero e sexualidade. Para isso, a escritora relembra das brincadeiras de “casinha” e das bonecas, a ela proibidas quando pequena por ser lida socialmente como um menino.

“Faço uma correlação das dinâmicas da vida adulta, que já são impostas e ensaiadas desde as brincadeiras, nada aleatórias, de infância”, explica Maria Lucas.

A escrita permeia caminhos tortuosos, com relação às dificuldades em ser um corpo LGBTQIA+ em sociedade, mas encontra-se forte quando este corpo, fora das normas sociais, se faz presente entre os seus, culminando assim nas “Multidões Queer”, termo trazido no texto homônimo do filósofo transgênero espanhol Paul Preciado.

Equipe do livro é formada unicamente por pessoas trans


“Escrevi porque escutei um som, vários. São outras que me chamam, de fora e de dentro de mim. Eu sou várias e escrevendo, as ressuscito no aqui e agora”.

(Trecho do livro “Mais uma Casa de Bonecas”).

“Mais uma Casa de Bonecas” conta com texto introdutório da brasileira radicada em Portugal,  Hilda de Paulo. Hilda, é editora da revista Performatus e busca re-trabalhar o imaginário social de mulheres trans brasileiras em Portugal através de, dentre outras iniciativas, o Arquivo Gis, onde retrabalha a história da travesti brasileira Gisberta Sauce. Hilda agrega um olhar que se distancia e se identifica com a obra de Maria Lucas.

“Sob uma ótica transfeminista, ‘Mais uma Casa de Bonecas’ ecoa – em sua narrativa – a ausência de solidariedade, a perda de oportunidade de entendimento do lugar que Ela ocupa e a recusa de sua presença em lugares inteligíveis que muitos feminismos radicais transexcludentes – e também movimentos LGBcis – assinalaram ao longo de décadas.

(Trecho do texto de Hilda de Paulo no livro “Mais uma Casa de Bonecas”)

Responsável pela identidade visual, Íra Barillo acrescenta a este um trabalho de foto e colagem. A parceria de Maria Lucas e Íra é de longa data, e inclui também o fotolivro “Montação”, com fotos da cultura artística LGBTQIA+ de regiões do país, com curadoria de Íra e textos de Maria. 

FICHA TÉCNICA: “Mais Uma Casa de Bonecas, de Maria Lucas”

Formato: 13,x19 cm

Páginas: 56 páginas

Ano de edição: 2022

Sobre Maria Lucas

Maria Lucas é atriz, performer e escritora, e única pessoa trans ganhadora do prêmio de textos ensaísticos do Instituto Moreira Salles com o ensaio Próteses de Proteção, publicado na Revista Serrote em 2020. Mestre em Artes da Cena (UFRJ), se dedica a escrever e atuar em projetos que reconfiguram o imaginário social de corpos trans no país que mais os mata em todo o mundo.

Foto de capa: Íra Barillo

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