BLOG

Casos de HIV cresceram 17% no Brasil, aponta boletim do Ministério da Saúde

Entre 2020 e 2022, o número de infecções registradas cresceu 17,2%, de acordo com o boletim do Ministério da Saúde

Por Jess Carvalho para Agência Diadorim

De acordo com o Boletim Epidemiológico de HIV/Aids, divulgado no início de dezembro pelo Ministério da Saúde, em 2022, foram registrados 43.403 novos casos de infecção por HIV no Brasil. Em comparação com 2020, esse número aumentou 17,2%. 

No documento, a pasta atribui o crescimento à diminuição da testagem para o HIV e/ou à subnotificação de casos em decorrência da pandemia de Covid-19. 

“O foco nesse período era apenas a Covid, e várias ações que rodeavam a epidemia de HIV foram deixadas de lado, desde questões relacionadas à prevenção até alguns suportes para as pessoas que vivem com HIV”, avaliam o infectologista Mateus Cardoso e o farmacêutico Devlyn Schil em entrevista à Diadorim.

Gabriela Junqueira Calazans, docente do Instituto de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo) que se dedica a estudar o tema, acredita que o recrudescimento da epidemia é também um efeito colateral do conservadorismo.

Segundo a pesquisadora, embora tenhamos mais tecnologias de prevenção do HIV do que nunca, estamos diante de um cenário de retrocesso marcado nas políticas públicas, com o crescimento de políticas anti-gênero e sexualidade.

“Se a gente olhar mais estreitamente para o campo das políticas públicas, vamos identificar, por exemplo, uma diminuição significativa das ações coletivas, das campanhas. A gente vai ficando cada vez mais com um espaço mais restrito para fazer um discurso aberto e positivo sobre sexualidade”, argumenta Calazans.

“A gente tem também literatura farta mostrando uma diminuição marcante do financiamento para organizações não governamentais de Aids, para movimentos sociais relacionados à sexualidade. Temos ainda uma restrição bastante importante das políticas de educação para a sexualidade nas escolas, com o constrangimento de professores e a invenção do termo ideologia de gênero”, completa a especialista.

Maior incidência entre pretos e pardos

“Na análise da variável raça/cor autodeclarada, observa-se que, até 2013, a cor de pele branca representava a maior parte dos casos”, indica o Boletim. “Nos anos subsequentes, houve um aumento de casos notificados entre pretos e principalmente em pardos, representando mais da metade das ocorrências a partir de 2015.”

Em 2022, entre os casos notificados no Sinan (Sistema de Informação de Agravos de Notificação), 29,9% ocorreram entre brancos e 62,8% entre negros (13% de pretos e 49,8% de pardos). No mesmo período, entre os homens, 30,4% dos casos ocorreram em brancos e 62,4% em negros (12,8% de pretos e 49,6% de pardos). Entre as mulheres, foram 28,7% brancas e 64,1% negras (13,8% de pretas e 50,3% de pardas).

Calazans explica que isso se deve à falta de acesso aos recursos de prevenção disponíveis. Com a redução no número de campanhas e políticas públicas voltadas ao combate da epidemia, e a precarização na educação sexual nas escolas, as pessoas com maior acesso à informação são privilegiadas. “A gente observa que quem acessa mais a PrEP (Profilaxia Pré-Exposição) e a PEP (Profilaxia Pós-Exposição) são os homens brancos com maior escolaridade e mais velhos”, comenta.

Cardoso e Schil atribuem a maior incidência da doença entre pessoas negras à “necropolítica” que decide quais são os corpos que merecem viver e morrer. “Os serviços especializados de HIV precisam estar próximos a essas populações, precisam descentralizar, estando presente nas periferias e também na vida das mulheres, principalmente das mulheres pretas”, colocam.

Combate ao preconceito

Entre 2012 e 2022, foram detectados 114.593 (23,4% do total) casos de jovens entre 15 e 24 anos com HIV, sendo 25% no sexo masculino e 19,6% no feminino. A série histórica também aponta que os homossexuais foram maioria entre as pessoas do sexo masculino com HIV registradas no Sinan: 140.507 (45,4%). 

Em 2022, considerando-se apenas o sexo masculino, 42,3% dos casos de HIV registrados correspondem à categoria de exposição HsH (homens que fazem sexo com outros homens). 

Não há dados em relação à identidade de gênero desses pacientes e não necessariamente homens que fazem sexo com homens se identificam como homossexuais ou bissexuais. 

Na opinião de Calazans, o dado aponta para uma maior necessidade de atenção em saúde a essa população, mas não deve servir ao preconceito contra os corpos em dissidência, pois esses não são os únicos grupos passíveis de serem infectados. 

“A gente é melhor sucedido na prevenção quando pode fazer abordagens comunicacionais abertas e positivas sobre sexualidade e prevenção nos espaços de circulação das pessoas mais afetadas”, fala, indicando a necessidade de a população LGBTQIA+ ser uma forte aliada no processo de conscientização sobre HIV/Aids.

Foto de capa:  Tomaz Silva/Agência Brasil

Notícias Relacionadas

Projeto “Lentes Coloridas” pesquisa perfil de profissionais LGBTQIA...

Casa 1 e Coletivo AMEM realizam Feira de Empregabilidade LGBTQIAPN+...

HQ Ciranda da Solidão é republicada e ganha edição especial

Conheça 10 pré-candidaturas LGBTQIA+ a prefeituras nas eleições de ...

Direitos LGBTQIAPN+ sob ataque no Congresso Nacional 

Instituições fazem mapeamento de candidaturas LGBTQIAPN+ para as el...

Com o tema “Aquilombar é Cura”, a Parada Preta 2024 aco...

Especialistas discutem os principais desafios de empregabilidade LG...

Pesquisa apresenta as maiores dificuldades das instituições LGBTQIA...

CUT lança cartilha de formação sindical como foco em pessoas trans

No fim das contas, ser orgulhosamente LGBTQIAPN+ era só moda mesmo

Senado aprova texto que cria recurso de proteção para LGBTQIA+ enca...