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Cantor traça paralelo entre o candomblé e a resistência LGBTQIA+

O cantor e compositor Paulo Fraval lançou esta semana seu mais novo single-clipe, “Ilás de Oxalá”.

A produção, assinada pela Voo Audiovisual (Salvador-BA), revela Fraval e outras personagens entoando uma oração potente e poética, fortalecendo esta narrativa com cenas em meio à natureza e também no terreiro de Mãe Alana, no quilombo urbano do Calabar, na capital baiana.

O lançamento de “Ilás de Oxalá” marca também o lançamento de uma campanha de financiamento coletivo para a construção da Casa Dandara Amazí, espaço vital de acolhimento e cuidado de jovens LGBTQIA+ que estão em situação de rua e vulnerabilidade por conta de suas identidades ou orientações sexuais em Salvador. Acesse a campanha aqui.

Fraval, que é natural de Ceará, mas há anos vive em Londres (Inglaterra), conta que “Ilás de Oxalá” foi escrita por Almerson Cerqueira Passos, poeta, baiano, gay, preto, do subúrbio, intelectual e grande estudioso do candomblé. De acordo com Fraval, “eu sou filho de Oxalá e quando pensei no conceito do disco (O Poder Que a Bixa Tem, meu primeiro disco solo) me dei conta de que seria muito pertinente abrir esse trabalho com uma oração, e imediatamente, convidei Almerson que generosamente aceitou de pronto e escreveu essa lindeza especialmente para o álbum”. 

Sobre o conceito da letra, Fraval também indica que “o Ilá é a voz do Orixá, seu modo de se identificar quando está entre nós. Mas o ilá não é só isso. É a própria natureza falando, gritando, nos lembrando do que é Orixá: o espírito da natureza. Seguindo esta narrativa, Almerson traça um paralelo entre os nossos próprios gritos de residências que, assim como os orixás, também são diversos”.  

O artista também explana que durante todo o processo de produção musical, sons da natureza foram propositalmente pensados para que pudessem dialogar com a própria letra, enfatizando o poder e o protagonismo da natureza em um momento de destruição e extermínio das matas, florestas e dos  povos indígenas. 

Em relação à produção audiovisual, ele compartilha que foram dois anos idealizando essas imagens, sonhando, buscando, juntando dinheiro e planejando.

“Produzir audiovisual é muito caro, especialmente para artistas independentes como eu. Existem pouquíssimas políticas públicas e nenhuma empresa privada se dispôs a apoiar um cantor queer, abordando narrativas de resistência e afetividades LGBTQIA+ periféricas embebidas por uma estética candomblecista. “A execução deste trabalho aconteceu depois de uma longa travessia, mas Oxalá bateu o pé e nós conseguimos! Em um momento onde as pessoas sentem-se bastante confortáveis para expressar seus ódios e fobias, nós as convidamos para encontrar conforto no amor e no acolhimento”, pontua Fraval. 

Um dos pontos que ele mais destaca quando fala sobre a produção de “Ilás de Oxalá” foi o espírito coletivo que conduziu o trabalho de toda a equipe durante a gravação do clipe. Mas não só quem estava atrás ou à frente das câmeras.

“Esse espírito de cooperação também foi contagiando as pessoas. No Calabar, por exemplo, a própria comunidade se envolveu nas gravações ajudando a equipe com o transporte dos equipamentos, fazendo silêncio para a execução das cenas”, completa Fraval. “Por mais que possa parecer clichê, Salvador é uma cidade que te envolve no sentido mais afetivo da palavra e esse lugar tem acolhido meus recomeços pessoais e musicais desde a minha adolescência com a minha antiga banda (Solange, tô aberta!) até esse trabalho mais recente. Eu rodo meio mundo, mas toda vez que recomeço, tenho a sorte de sempre poder voltar aqui”.  

O terreiro de Mãe Alana 

Alana de Carvalho é uma mulher trans e quilombola que chegou aos 40 anos vivendo no Brasil, país com índices alarmantes de violência contra pessoas transexuais. E, mesmo vivendo em uma comunidade cotidianamente bombardeada pelas brutalidades da desigualdade social, dedica boa parte de sua vida buscando melhorias e oportunidades para pessoas à sua volta.  

Líder de um terreiro em Calabar, bairro periférico da cidade de Salvador (BA), Mãe Alana vem sendo alguém fundamental no acolhimento de jovens LGBTQIA+ que se encontram em situação de abandono social na cidade. Pelo trabalho social que realiza, além de sua amizade com Fraval, foi uma preocupação muito forte do cantor que Mãe Alana estivesse retratada em todas as suas potencialidades no clipe de “Ilás de Oxalá”.

“Ter trabalho com Paulo Fraval foi incrível. Ele é uma pessoa única e maravilhosa, despido de qualquer preconceito, de qualquer pensamento negativo”, continua Mãe Alana, que aproveitou a oportunidade para falar mais sobre o trabalho que realiza. “Espero que a partir de ‘Ilás de Oxalá’ a gente consiga sensibilizar mais pessoas que possam doar, divulgar e assim nos ajudar a concretizar esse sonho, que é meu e de todas nós, todos os nossos corpos e corpas, tanto as mulheres trans, as travestis, quanto os homens transexuais também, que é a abertura da primeira casa estadual de acolhimento para nossos corpos LGBTQIA+, que além de um espaço de acolhimento, será também uma casa de preparação destes corpos para reentrada na sociedade, oferecendo cursos de empreendedorismo social, formação educacional, pedagógica e letramento”, detalha Mãe Alana. 

Para saber mais informações da campanha, que já está aberta para apoios, acesse o site.

A Casa 1 é uma organização localizada na região central da cidade de São Paulo e financiada coletivamente pela sociedade civil. Sua estrutura é orgânica e está em constante ampliação, sempre explorando as interseccionalidade do universo plural da diversidade. Contamos com três frentes principais: república de acolhida para jovens LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros) expulsos de casa, o Galpão Casa 1 que conta com atividades culturais e educativa e a Clínica Social Casa 1, que conta com atendimentos psicoterápicos, atendimentos médicos e terapias complementares, com foco na promoção de saúde mental, em especial da comunidade LGBT.

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