Desde o início da Casa 1 tentamos entender e aplicar as melhores práticas para arrecadação de verba para a manutenção do projeto. Nossa base é o financiamento coletivo recorrente, onde pessoas doam individualmente um valor mensal por meio da plataforma Benfeitoria.
Além disso desenvolvemos uma série de ações com marcas e empresas que contemplam trabalhos de formação, sensibilização, empregabilidade e também arrecadações e doações. Esse é um campo muito delicado, afinal somos um projeto que propõe mudanças estruturais e políticas que pensam no todo, por isso desde o começo definimos não fazer ações com empresas de determinados campos de atuação como instituições bancárias, petroquímicas, construtoras e laboratórios farmacêuticos, entre outros.
Com essas restrições auto imposta, atreladas a LGBTfobia ainda muito grande, onde a grande maioria das organizações se recusam a encarar a diversidade do mundo e as próprias práticas do mercado, como por exemplo os contratos de exclusividades, a possibilidade de obtenção de recursos diminui drasticamente.
Não é raro nos últimos anos que marcas se juntem para ações publicitárias específicas mas são sempre baseadas em estudos de marketing e temos, assim como outras organizações dialogado com as empresas para que elas entendam que o trabalho de responsabilidade social e suporte para ONGs não deve passar pelas lógicas do marketing apenas e por isso a ideia de concorrência não se aplica.
E agora, pela primeira vez desde 2017, duas empresas toparam fazer ações com a Casa 1 mesmo com a presença da marca concorrente sem estarem ligadas por uma ação conjunta. Foram as empresas Pernod Ricard (responsável por rótulos como Absolut, Chivas e Ballantine’s) e Diageo ( Smirnoff, Johnnie Walker e Ciroc).
No caso da Pernod Ricard, 100% dos lucros da edição especial de Absolut vendidas até o dia 30/07 ou até enquanto durarem os estoques vem para a Casa 1 e organizações do nordeste. “Este ano, por conta da pandemia, nos deparamos com a realidade de vulnerabilidade social de parte da comunidade LGBTQIA+. Em meio ao isolamento social, o preconceito se reflete em uma dificuldade de acesso à saúde e a redes de suporte adequadas, onde muitas vezes não há espaço para acolhimento. Sendo assim, por meio do Projeto AB., iniciativa de Absolut em parceria com a BATEKOO, que é uma coletivo LGBTQIA+ de representação negra e periférica promovemo a campanha Orgulho Incancelável traz esse auxílio através de parte da venda revertida da icônica garrafa de Absolut Rainbow e um QR Code especial para doação para a Casa 1”, explicou a equipe da empresa.
Já a no caso da Diageo, parte das vendas de bebidas no site até 30/06 serão revertidas para Casa 1. “Para nós o mês do orgulho LGBTQIA+ será marcado por três iniciativas. Por meio de nosso e-commerce, promovemos a ‘Pride Week’ onde, serão doados R$ 50 mil –resultado de parte das vendas na loja online – a projetos da instituição social. Além disso, anunciamos em junho um plano de recrutamento com foco em pessoas transgênero para atuação no escritório da Ypióca, em Fortaleza (CE) e por fim, lançamos o ‘Grupo Rainbow Network Brasil’, um grupo de afinidade para reunir funcionários LGBTQIA+ e aliados, buscando fomentar uma cultura de inclusão e igualdade e propor uma agenda de ações afirmativas junto ao comitê de Diversidade”, apontou a equipe da marca.
Conversamos ainda com as duas empresas sobre suas atuações para além do dia do Orgulho e como se dá essa relação com concorrência
Casa 1: Para começar como começou a relação da empresa com a diversidade?
Pernod Ricard: A relação se deu muito através de Absolut, sua marca premium de vodka. Desde o início dos anos 80, Absolut participa e apoia diversas atividades relacionadas ao orgulho da diversidade, como o lançamento da primeira garrafa de destilado revestida com a bandeira de arco-íris, feita em colaboração com Gilbert Baker,o designer responsável pela bandeira original. No Brasil, Absolut promoveu em 2017 a campanha “Arte Resiste; que ressaltou o orgulho LGBTQIA+ enquanto resistência artística a partir de uma empena em um dos prédiosvizinhos ao Minhocão, em São Paulo, com mural pintado pela multiartista Patrick Rigon.Participaram do projeto o trio As Bahias e a Cozinha Mineira e a cantora Linn da Quebrada. E em 2019 se uniu ao coletivo BATEKOO para dar vida ao Projeto AB. de capacitação profissional para pessoas LGBTQIA+.
Diageo: A relação da Diageo com a diversidade sempre existiu. A empresa possui uma cultura forte baseada no pilar “Valorizar uns aos outros”. Esse valor é vivido e celebrado diariamente, refletindo-se no respeito às diferenças e, em nossa crença, de assim chegaremos a um lugar mais equânime e representativo do nosso consumidor e sociedade. Todo o movimento foi intensificado a partir de 2017, com a criação do Comitê de Diversidade e Inclusão, que lidera transformações mais profundas em nossa organização, principalmente em representatividade, engajamento interno, reputação e cultura. Os últimos três anos foram de muitas conquistas, como o aumento do engajamento interno com a agenda LGBTQIA+ da empresa.
Casa 1: Parte da arrecadação dos produtos das duas marcas vão ser direcionadas para Casa 1 mesmo elas sendo concorrentes entre si. Vocês acreditam que existe um momento onde a rivalidade das marcas devem deixar de existir?
Pernod Ricard: Acreditamos que um mundo com mais respeito, cores e diversidade é algo pelo que todos devem lutar, independente de concorrências. A iniciativa privada precisa se unir em prol assuntos de interesse público, relevantes e urgentes, principalmente em um momento tão difícil como o que estamos lidando. Só assim poderemos levar adiante os pilares que prezamos como empresa e destinar não só aos consumidores, mas a todos, ações com retorno social significativo, lutando pelo progresso.
Diageo: Agendas como sustentabilidade, governança, direitos humanos e diversidade não devem possuir concorrências, são ações realizadas em prol de uma sociedade melhor para todos. Logo, celebramos juntos e de forma genuína e correta as iniciativas. Interações entre as redes sociais oficiais das empresas são maneiras de mostrar o apoio entre as marcas.
Casa 1: Existe uma ideia de que marcas e empresas perdem e sofrem boicotes por se posicionarem em relação a pautas dos chamados grupos minorizados. É um mito?
Pernod Ricard: Quando destinamos nossa comunicação ou ações a comunidade LGBTQIA+, é preciso haver uma preocupação com a apropriação de signos e vivências, que são proprietárias e muitas vezes símbolos de resistência. Então, o papel das marcas é ser uma plataforma para visibilidade e apoio destas lutas e não uma porta voz. Por isso, desde os anos 80, Absolut amplifica e apoia atividades relacionadas ao orgulho da diversidade, se posicionando em favor e com a respeito à luta LGBTQIA+.
Diageo: O mercado é muito cauteloso em se posicionar, ofuscando pautas importantíssimas que deveriam ser lideradas pelas empresas. Na Diageo usamos o termo ‘Keep Walking The Talk’, fazendo referência ao mote da nossa marca Johnny Walker, keep walking – uma mensagem progressista com olhar para o futuro. Quando nos posicionamos como marca, mostramos que nossa fala (talk) é convertida em ações afirmativas (walk).
Casa 1: E como são as políticas internas de diversidade dentro das organizações?
Pernod Ricard: A Pernod Ricard mundialmente presa por políticas internas em prol da diversidade através de comitês de discussões, incentivando o debate e aplicação de pautas tão urgentes como equidade de salários para mulheres e diversidade em cargos de liderança
Diageo: A empresa possui duas políticas destaques em relação a diversidade. A política de ‘Dignidade no Trabalho’, que garante que todos podem ser quem são, independentemente de seu background, gênero, orientação sexual, idade, etnia, religião e característica física. Também proíbe bullying, assédio de qualquer tipo e ambiente de ameaças e intimidação. Esta política celebra a diversidade e promove um ambiente de inclusão dentro da empresa. E a segunda é a ‘Política de Licença Familiar’. A Diageo foi a primeira empresa a lançar a política de licença familiar globalmente, atingindo 30 mil funcionários. Ela dá direito a todos os colaboradores a tirarem seis meses de licença parental, incluindo casais homoafetivos com processos de adoção. Esta política vem para reforçar o papel do casal, criando um ambiente equânime na composição familiar e, consequentemente, nas possibilidades de carreira dentro da empresa.