Propostas desfavoráveis às mulheres podem ganhar apoio de novas lideranças no Congresso

Análise do Elas no Congresso mostrou que projetos de lei que tratam do tema aborto ou violência sexual cresceram 77% e 56% entre 2019 e 2020, e a maioria dos PLs é desfavorável

Por Bárbara Libório

Era agosto de 2020, em meio à pandemia de coronavírus, quando o caso de uma criança de 10 anos que engravidou após ser violentada por um tio, no Espírito Santo, ganhou o noticiário brasileiro. O Tribunal de Justiça do estado concedeu a ela o direito previsto em lei de interromper a gravidez fruto de um estupro, mas as reações vieram de todos os lados, inclusive do Congresso. O número de projetos de lei que tratam do tema aborto ou violência sexual na Câmara e no Senado cresceram 77% e 56%, respectivamente, entre 2019 e 2020, segundo levantamento do Elas no Congresso, plataforma de monitoramento legislativo da Revista AzMina. 

Mas a reação de deputados e senadores tem sido negativa para mulheres e meninas: a maior parte dos projetos é desfavorável. E, com a nova configuração do Congresso, os retrocessos podem vir a tramitar mais facilmente. 

Os projetos de lei criados em reação ao caso do Espírito Santo, e também a outros de repercussão nacional, ilustra bem o cenário do Congresso Nacional nos últimos dois anos, a primeira metade da legislatura que começou com as eleições gerais de 2018: nunca se falou tanto sobre temas importantes como os diversos tipos de violência contra a mulher e os direitos sexuais e reprodutivos. O problema é que esses projetos refletem seus autores: o Congresso mais conservador há pelo menos três décadas.

Elas no Congresso analisou junto a 17 organizações que trabalham com os direitos das mulheres 649 projetos de lei sobre gênero que foram criados em 2019 e 2020 no legislativo brasileiro. 

Descobrimos que 1 em cada 4 projetos são desfavoráveis aos direitos das mulheres. Além de projetos que tentam restringir direitos, como no caso do aborto legal, ou que desvirtuam legislações importantes para o combate à violência contra a mulher, como a Lei Maria da Penha, grande parte dos projetos negativos focam exclusivamente na punição do autor da violência em diferentes situações. São medidas que efetivamente aumentariam o encarceramento no país e, segundo as organizações consultadas, não resolveriam as questões estruturais dos problemas que envolvem gênero no país

VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER

O tema mais recorrentemente abordado pelos congressistas em projetos de lei nos últimos dois anos é o da violência contra a mulher: 48% dos PLs sobre gênero no Congresso falam de violência doméstica, sexual, política, feminicídio, e outros tipos de agressão. Mas só um dos temas foi tratado de maneira 100% favorável para as mulheres: a violência política. São cinco projetos que focam principalmente em definir o que é violência política e também na proteção de mulheres e responsabilização dos agressores.

No caso dos projetos de lei sobre violência sexual, 68% deles foram avaliados de maneira negativa. E também quando o assunto é feminicídio, mais da metade dos projetos (61%) foi considerada desfavorável. 

A cientista política Flavia Biroli pontua que existem parlamentares no Congresso que se identificam com a agenda de combate à violência contra a mulher, mas com uma perspectiva conservadora. Como reflexo disso, os projetos de lei partem de um ponto de vista mais conservador e também mais punitivista.

“Estamos vivendo um estado mais penal e de ausência de políticas públicas. A política de combate à violência contra a mulher nunca foi implementada a nível nacional. Se ela fosse melhor executada, a gente teria um ímpeto punitivista menor”, explica Priscilla Brito, assessora técnica do Cfemea (Centro de Estudos Feminista e Assessoria). Na prática, se as políticas públicas não funcionam, o debate sobre a punição para supostamente “frear o problema” ganha espaço.

VIOLÊNCIA SEXUAL

No caso da violência sexual, boa parte dos projetos foram apresentados em reação ao caso da criança de 10 anos estuprada pelo tio. O PL 4345/2020, de autoria do deputado Gurgel (PL-SP), por exemplo, altera o Código Penal para “punir com mais rigor” o crime de estupro de vulnerável praticado contra menores de dez e cinco anos, mas não apresenta nenhuma solução para os desafios de proteção às vítimas. O PL foi avaliado negativamente pela Artigo 19. O mesmo acontece com o PL 4271/2020, do Delegado Antônio Furtado (PSL-RJ). 

“Esse é um desafio enorme. A gente tem dificuldade de imaginar alternativas fora do punitivismo. A gente reconhece que uma pessoa que é responsável por um ato violento tem que ser responsabilizada. Mas o que podemos construir de alternativa? Vivemos em um país racista e desigual, onde o encarceramento tem alvo certo: o homem negro e pobre”, questiona Biroli. Para a cientista política, se estamos criando um feminismo em que o antirracismo é uma questão central, precisamos de respostas que não reproduzam o racismo e a desigualdade de classe.

Brito também ressalta que a reação das mulheres, ao perceberem que os agressores estão sendo presos mais facilmente, pode ser a de deixar de denunciar. Isso porque em 79% dos casos de violência doméstica o agressor e a vítima têm ou já tiveram um relacionamento íntimo. Mais que o laço emocional, muitas mulheres são dependentes economicamente desses companheiros.

“A violência acontece dentro de casa. Essas propostas têm a perspectiva de que o violentador é o homem do beco, o monstro do imaginário [popular]. Não é isso, é uma pessoa do círculo de afeto da mulher. As medidas preventivas passam também pela educação em termos de gênero, isso deveria estar sendo melhor discutido, mas acabou sendo demonizada pelo governo”, explica Gabriela Rondon, pesquisadora da Anis – Instituto de Bioética, Direitos Humanos e Gênero.

A DISPUTA PELO ABORTO 

Outra discussão veio a rebote do debate sobre a violência sexual com o caso do Espírito Santo: o direito ao aborto já previsto na lei. “Ninguém esperava que em 2020, em plena pandemia, o aborto voltasse pra pauta política com tanta força, e com uma narrativa preponderante de entender que essa menina tinha direito ao aborto legal. Os extremistas, aquelas pessoas na porta do hospital, perderam a narrativa, foram vistos como cruéis, excedentes. Isso gerou um curto circuito”, conta Rondon.

O governo federal, por meio do Ministério da Saúde, tentou resolver a questão com uma “canetada”: uma portaria que dificultava o acesso ao procedimento. As normas obrigavam os médicos a avisar polícia sobre pedidos de aborto por estupro e até a perguntar se gestante gostaria de ver o ultrassom do feto.

E o Congresso, principalmente a bancada feminina e feminista, reagiu, protocolando uma série de projetos de decreto legislativo que sustavam a portaria. Sob pressão, o primeiro texto, de agosto, foi revogado e uma nova portaria, que está em vigência, foi editada em setembro pelo Ministério da Saúde. O texto ainda prevê, por exemplo, que médicos comuniquem o fato à autoridade policial responsável e preservem possíveis evidências materiais da violência sexual.

Depois, em outubro de 2020, o governo federal lançou a Estratégia Federal de Desenvolvimento para o Brasil no período de 2020 a 2031, e colocou como meta a defesa da vida “desde a concepção” e dos “direitos do nascituro”. Ou seja, uma agenda antiaborto. As parlamentares mulheres do PSOL protocolaram um projeto de decreto-legislativo (PDL) que suspende esse trecho do documento. 

Para Rondon, é importante fazer uma leitura desse movimento do governo federal. “Eles esperavam que fosse mais fácil passar essas pautas no Congresso no governo do presidente Jair Bolsonaro. Viram que não e começaram a avançar por medidas do Poder Executivo. Tivemos uma vitória no legislativo que foi não deixá-los avançar”, diz. 

O FUTURO

Apesar dos projetos de lei que foram criados, as pautas “morais” não avançaram muito no Congresso nos últimos dois anos, como ressaltou Rondon. Em parte, porque o presidente da Câmara, onde a maior parte dos projetos são protocolados, era o deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), que não tinha interesse ou compromisso com esses temas. A nova eleição da liderança da Câmara, no entanto, pode mudar o quadro – para pior.

Desde o início do ano, o novo presidente da Câmara é o deputado Arthur Lira (PP-AL), candidato apoiado pelo governo Jair Bolsonaro. A eleição de Lira foi uma vitória para os deputados conservadores. Apoiado também pela bancada evangélica e pela Frente Parlamentar Mista contra o Aborto e em Defesa da Vida, ele deve enfrentar pressão para tornar mais dura a legislação contra o aborto no Brasil. A deputada Chris Tonietto (PSL-RJ) chegou a entregar a ele um termo de compromisso contra as pautas de gênero, sexualidade, família e direito ao aborto.

“Francamente, estamos esperando o pior. Talvez não avance algo tão bizarro como o Estatuto do Nascituro, por exemplo, porque já o enfrentamos muito, mas pode passar algum outro tipo de retrocesso”, diz Brito, assessora do Cfemea.

Outro motivo para o temor tem a ver com a escolha das lideranças das comissões da Câmara. Pela primeira vez teremos uma mulher à frente da Comissão de Constituição, Justiça e de Cidadania (CCJ), que analisa a constitucionalidade e a juridicidade de todas as propostas em análise na Câmara e ainda aprova projetos em caráter conclusivo, sem precisar passar pelo Plenário. Pelos próximos dois anos Bia Kicis (PSL-DF), conservadora, bolsonarista, negacionista e anti-aborto, estará a frente da comissão. Hoje, ao menos 12 projetos relacionados ao tema do aborto estão na CCJ.

“Todos os cenários apontam para ficarmos ainda mais vigilantes. É importante que todos os setores se movimentem”, diz Rondon. 

QUEM PAUTA GÊNERO

No legislativo, a movimentação pelos direitos das mulheres não acontece sem as parlamentares mulheres. Os dados analisados por Elas no Congresso mostraram que 82% das mulheres parlamentares eleitas apresentaram PLs sobre gênero, enquanto apenas 46% dos homens parlamentares fizeram o mesmo. 

O debate não é só quantitativo, mas qualitativo também. A produção legislativa feminina é mais favorável aos direitos das mulheres: apenas 21% dos projetos que têm a autoria ou coautoria de uma mulher são desfavoráveis. No caso dos homens, o percentual é de 26%. 

Mais: 69% dos projetos desfavoráveis têm autores ou coautores homens, enquanto apenas 33% deles têm autoria ou coautoria de mulheres (lembrando que um projeto de lei pode ter autores de ambos os gêneros).

PARTIDOS

Quando analisadas as produções dos partidos, apenas dois deles alcançaram 100% de projetos favoráveis aos direitos das mulheres: o PCdoB e o PV. O PSOL aparece em seguida, com 95% – o único PL avaliado como desfavorável é o PL 5208/2020 por ter o potencial de desvirtuar a aplicação da Lei Maria da Penha segundo a Themis. 

Na outra ponta estão PSL, que tem mais da metade (52%) dos projetos desfavoráveis aos direitos das mulheres, o AVANTE que tem metade dos projetos avaliados negativamente, e o MDB, com 32% dos projetos desfavoráveis.

Numericamente, o PT é o partido com mais projetos de lei sobre gênero. Em seguida aparecem PSDB e PSL. Mas também há quem não se interesse pelo tema: os parlamentares do partido NOVO não apresentaram nenhum projeto sobre gênero no Congresso nos últimos dois anos. 

Com base nas avaliações de todos os 649 projetos de lei, foi montado um ranking interativo da atuação parlamentar em relação aos direitos das mulheres. No site ainda é possível ver cada um dos projetos avaliados e os comentários sobre ele, além da metodologia de ranqueamento. Os dados também estão disponíveis para download.

Vale destacar que entre os dez primeiros colocados na Câmara, nove são mulheres, todas do PSOL, PT e PCdoB. Já entre os dez piores colocados, oito são homens. No Senado são quatro mulheres entre as dez melhores posições e nenhuma entre as dez piores. 

Participaram das avaliações dos projetos as organizações: Instituto Maria da Penha, Instituto Patrícia Galvão, Themis, Artigo 19, Observatório da Violência Obstétrica no Brasil, Rede Feminista de Juristas deFEMde, Coletivo Mana a Mana, Anis, Ecos, TretAqui, Empodera, Sempreviva Organização Feminista (SOF), Sexuality Policy Watch (SPW), CFEMEA, Grupo de Estudos de Gênero e Política (Gepô – USP), LabCidade (USP), Mulheres Negras Decidem e Cepia.

25 materiais para entender como foi a Ditadura para LGBTs

No dia 31 de março de 1964 aconteceu o golpe militar no Brasil, fazendo com que o país mergulhasse em 21 anos de censura e violentas repressões.

O golpe de 64 foi o mais longo período de interrupção democrática no país. Os “anos de chumbo” foram marcados pela cassação de direitos civis, repressão violenta a qualquer tipo de manifestação popular contrária ao regime, censura à imprensa e assassinatos e torturas de militantes e civis.

Além de aparatos de repressão contra “comunistas”, os aparelhos da ditadura também exerceram controle moral sobre os corpos subversivos. Prostitutas, homossexuais e travestis foram perseguidos pelo regime e alvos de detenções arbitrárias, censura, demissão de cargos públicos e outras formas de violência.

Contudo, a comunidade LGBT respondeu a essa forte repressão com o fortalecimento de movimentos de resistência e, ao fim dos anos 1970, muitos desses grupos se mobilizaram para enfrentar a violência do Estado, em defesa dos seus direitos.

Nessa lista separamos entrevistas, perfis e materiais que eram usados por movimentos na reivindicação dos seus direitos.

Filme “Temporada de Caça” (1988), de Rita Moreira que trata da onda de assassinatos de homossexuais que assolava São Paulo e Rio de Janeiro nos anos 80

Catálogo da exposição “Orgulho e Resistências: LGBT na Ditadura” do Memorial da Resistência.

A mostra realizada em parceria com o Museu da Diversidade Sexual e com curadoria de Renan Quinalha, faz um recorte histórico sobre as relações entre autoritarismo, diversidade sexual e gênero durante a ditadura civil-militar (1964-1985). O catálogo está disponível gratuitamente para download e apresenta conteúdos exibidos na mostra, como cartazes de teatro, documentos e fotografias da época. Uma série de textos aprofunda assuntos como as resistências do período, a perseguição e as detenções em massa da polícia e as reivindicações políticas do movimento homossexual na ditadura. Há também materiais que compõem o Acervo Bajubá.

A Casa 1 colaborou como mediadora através do nosso grupo Instituto Temporário de Pesquisa Sobre Censura.

Acesse o catálogo aqui.

Seminário “O que Resta da Ditadura”, com participação de Maria Rita Kehl, Renan Quinalha e Janaína Teles.

O debate, organizado pela “TV Boi Tempo”, propõe uma reflexão sobre a relação mal resolvida do Brasil com a ditadura militar, o papel das Comissões da Verdade e o esquecimento como produtor de sintomas sociais na atualidade. A partir dos resquícios do período de exceção na organização social do país, a pergunta que dá nome ao encontro norteia a reflexão sobre resistência e o progressivo alcance de discursos de ódio, intolerância e exaltação de um dos piores momentos de nossa história.

Participação do João Silvério Trevisan ao programa “Estação Plural”

João Silvério Trevisan está na luta pelos direitos LGBTs desde os anos 70, quando participou da criação do grupo Somos, de defesa dos homossexuais, e criou o jornal Lampião da Esquina, uma referência ainda hoje. É também autor do livro Devassos no Paraíso, o maior tratado sobre a história da homossexualidade no Brasil.

Podcast com as aulas do Instituto Temporário de Pesquisa sobre Censura (com Rita von Hunty, Renan Quinalha, Thiago Amparo, Renata Carvalho e muito mais!)

As aulas abertas fizeram parte do “Dossiê Censura”, que ocupou diversos espaços do Centro Cultural São Paulo – CCSP, tendo como base a Sala de Vidro – Ação Educativa, em janeiro de 2020. Durante o período de trabalho, o Instituto realizou um amplo atendimento ao público através de um ateliê gráfico aberto e diversas aulas abertas sobre a trajetória da censura no país. A ideia do projeto é abordar a amplitude da censura que nos acompanha desde o processo de colonização e passa por práticas políticas, sociais, econômicas, raciais e de gênero, entre outros tantos recortes e processos, traçados em cartografias coletivas.

As aulas podem ser acessadas aqui.

Portal Memórias da Ditadura do Instituto Vladmir Herzog

O Instituto Vladimir Herzog luta pelos valores democráticos: essa missão requer o resgate da nossa História – especialmente da mais recente, ocultada pela ditadura sob sistemática censura – e a sua exposição às novas e às próximas gerações. Acesse o portal.

Acervo Bajubá

O Acervo Bajubá é uma projeto de preservação, salvaguarda e instigação historiográfica da arte, memória e cultura LGBT brasileiras.

Todas as edições do Lampião da Esquina, publicação de imprensa alternativa e que discutia homossexualidade, que circulou de 1978-1981

Acesse o acervo de edições digitalizadas.

Depoimento de Neon Cunha para o podcast “Pessoas: Vidas Negras” do Museu da Pessoa

Descrição do episódio: “Neon dos Afonso Cunha nasceu em 24 de janeiro de 1970, em Belo Horizonte. Sua família mudou-se para São Bernardo do Campo, ABC de São Paulo, quando tinha cerca de 2 anos. Terceira de dez filhos, desde cedo foi vítima de surras do pai, metalúrgico, e dos irmãos por parecer afeminada. Começou a trabalhar aos 11 anos, para ajudar na renda familiar, como mensageira na prefeitura de São Bernardo. Na mesma época conheceu a realidade das travestis no centro de São Paulo. Após anos sofrendo ameaças, espancamentos e estupros, Neon decidiu que precisava resolver duas coisas: o ‘direito à morte digna e o direito a ter nome e gênero’. Hoje é ativista, questionadora da branquitude e cisgeneridade tóxicas.”

Comissão Nacional da Verdade – Ditadura e Homossexualidade: resistência do movimento LGBT

A Comissão Nacional da Verdade decidiu  incluir, em seu relatório final, um capítulo específico sobre as violações de direitos humanos das pessoas LGBTs, apesar da resistência de alguns de seus componentes. Leia mais.

Depoimento de Martinha, para o projeto #Colabora

Autoritarismo e diversidades | Entrevista com João Silvério Trevisan

Autoritarismo e diversidades | Entrevista com Jane Di Castro

Autoritarismo e diversidades | Entrevista com João W. Nery

Websérie Memórias da Diversidade Sexual – Museu da Diversidade Sexual

A websérie tem como objetivo apresentar os depoimentos de pessoas LGBTI acima dos 65 anos, residentes na cidade de São Paulo que contam suas experiências de infância, adolescência e velhice na cidade, como repressão, relação com a família, com a noite e militância.

Entrevista do Leo Moreira Sá para o podcast “Passagem só de Ida“, da Casa 1

“Quantas vidas cabem na vida de Leo Moreira Sá? Nascido em São Simão, a cidade do meteoro, no interior de São Paulo, em uma família de nove irmãos, a vida de Léo foi marcada por uma busca incessante por sua identidade. Desde que se mudou para a Grande São Paulo, vivendo primeiro em São Bernardo do Campo, ABC Paulista, e depois na Capital, Léo já foi estudante universitário na USP, participou de grupos de militância nos últimos anos da ditadura militar, entrou para a banda de rock Mercenárias como seu baterista e circulou por espaços diferentes da noite paulista entre o final dos anos 1970 e o início dos anos 2000. Como ele mesmo conta, ele teve a sorte de conhecer pessoas maravilhosas e estar em lugares maravilhosos, o que lhe permitiu sobreviver à falta de liberdade dos anos da ditadura e construir o seu próprio entendimento de quem ele era e de qual era o seu universo. Hoje, Léo se identifica como um homem transexual e artivista, que coloca a sua arte a favor da verdade da comunidade transexual e pela conquista de seus direitos.”

Escute o episódio aqui.

Cassandra Rios, a escritora lésbica mais censurada durante a Ditadura

“Ela estava longe de ser comunista e seus livros mal falavam sobre política. Mesmo assim, Cassandra Rios foi a escritora mais censurada pela ditadura militar. Até 1985, 37 dos seus livros haviam sido, em algum momento, retirados do mercado. A editora CBS, que editava suas publicações, chegou a ser fechada pelos militares. A censura não era algo novo para Cassandra. Ela, que estreou na literatura em 1948, já havia sido processada pelo Estado em 1952, durante o governo eleito de Getúlio Vargas. Na democracia ou na ditadura, o crime foi o mesmo: expor em livros o prazer feminino.”

Leia mais sobre a escritora nessa reportagem do jornal Marco Zero.

LGBTs no Regime Militar – As Lésbicas Feministas

Rosely Roth no programa da Hebe Camargo em maio de 1985

Rosely Roth fez parte do levante no Ferro’s Bar, um ato de resistência lésbica durante a Ditadura Militar.

Do footing aos afters: vem com a gente fazer uma viagem pela cena noturna LGBT de São Paulo nos últimos 100 anos

“Balada gay, festa queer, bafo LGBT, fervo das empoderadas… Hoje em dia, é comum vivenciar esses eventos, principalmente na cidade de São Paulo, conhecida por sua vida noturna fervilhante. Afinal, a cultural da noite gay é uma realidade indiscutível. Mas nem sempre foi assim. Houve um tempo em que o que se ouvia sussurrar, à boca pequena, era algo tipo “boate para entendidos”, “festa alternativa”, e por aí afora. Para chegarmos até o momento em que a São Paulo tem uma das maiores Paradas Gays do mundo e um festival inteiro pra chamar de seu, o Milkshake, que rola dia 16/6, na Barra Funda, foi um longo caminho. Então prepare-se para (re) conhecer essa trajetória. Vamos embarcar no… túnel do tempo da noite LGBT paulistana.” Leia o texto completo aqui.

Entrevista com Bayard Tonelli (Dzi Croquettes)

Entrevista com Ciro Barcelos (Dzi Croquettes)

Encenação de 1982 da peça “O Rei da Vela”, pelo Teatro Oficina Uzyna Uzona

Documentário Meu amigo Claudia, de Dácio Pinheiro, sobre Claudia Wonder

Atriz e escritora, Claudia Wonder atuou em peças do Teatro Oficina, fez performances em boates como Madame Satã e militou pelos direitos LGBT. Deu palestras sobre preconceito e organizou campanhas a fim de arrecadar dinheiro para travestis em situação de rua. Morreu aos 55 anos, em novembro de 2010. Assista o documentário.

Aula “Para Derrotar o Fascismo: Organizar e Lutar por Direitos LGBTQ+” com Symmy Larrat

Ministério da Saúde inclui pessoas que vivem com HIV em grupo prioritário de vacinação contra a Covid

BRASÍLIA, DF

O Ministério da Saúde publicou uma nota técnica que passa a incluir, entre os grupos prioritários para vacinação contra a Covid-19, todas as pessoas que vivem com HIV entre 18 e 59 anos.

Desde janeiro, parte desse grupo já estava incluído na previsão de vacinação de pessoas com comorbidades, mas havia a exigência de testes de contagem de linfócitos T CD4 menor que 350 -o que era visto como impasse por movimentos da área.

Agora, a nota técnica amplia essa previsão. No documento, o ministério diz que a medida segue “novas evidências científicas publicadas sobre o risco de desfechos negativos da Covid-19 em pessoas vivendo com HIV”.

Também visa “reduzir o impacto da pandemia nesse grupo, especialmente em relação ao risco de hospitalização e óbito, e respeitar o conceito de equidade do Sistema Único de Saúde”, aponta.

A decisão por incluir apenas aqueles até 59 anos ocorre devido ao fato de que pessoas com mais de 60 anos já são alvo prioritário da vacinação, independente de comorbidades ou não.

Segundo o ministério, a recomendação deve passar a fazer parte de nova versão do plano de vacinação, prevista para ser publicada em abril.

Atualmente, o grupo de pessoas com comorbidades (que inclui também pacientes com diabetes, hipertensão, entre outros, e onde agora também entram aqueles que vivem com HIV), está previsto como o 14º a receber a vacinação contra a Covid, logo após pessoas de 60 a 64 anos.

Alguns estados, porém, têm passado outros grupos à frente da campanha de imunização, como policiais.

Para receber a vacina, pessoas que vivem com HIV que já constam em sistemas do SUS para receber medicamentos terão um pré-cadastro automático para a campanha de vacinação ou declaração entregue por unidades que fornecem os remédios.

“Também podem apresentar o receituário dos antirretrovirais, exames, relatório médico, prescrição médica, como forma de comprovar a condição”, informa a pasta.

A nota recomenda ainda que serviços de saúde que já fazem atendimento a pessoas que vivem com HIV organizem, se possível, a vacinação nesses locais, de forma a diminuir riscos de quebra de sigilo sobre o diagnóstico.

Segundo o ministério, a contraindicação da vacinação para esse público segue o mesmo critério da população em geral, que não recomenda doses a pessoas com hipersensibilidade ao princípio ativo ou a componentes da vacina, ou com histórico prévio de reações.

Porque Rodolffo tem que ser o eliminado de hoje no BBB

Sim, falamos que não iríamos mais cobrir os desdobramentos do BBB, mas, devido as falas e comportamentos explicitamente homofóbicos do participante Rodolffo, cantor sertanejo da dupla Israel e Rodolffo, decidimos nos posicionar contra a permanência do participante no reality.

Para isso, pedimos a opinião de uma pessoa que já é “comentarista oficial para assuntos de BBB“, Eduardo Oliveira Junior. Idealizador dos podcasts “Santíssima Trindade das Perucas”, “Disk Bicha” e o “Big Bicha Brasil”, ele falou para a Casa 1 porquê Rodolffo tem que ser o eliminado da noite.

” Nesse paredão de Rodolffo, Juliette e Sarah, acho que a pessoa mais adequada pra sair é o Rodolffo.

Diversas vezes ele teve falas homofóbicas dentro do programa e, principalmente, em cima do Gilberto, que é uma bicha que tá realmente vivendo como afeminada, como ela é, dentro desse programa a “bicha bichérrima” como ele mesmo se descreve. E é muito complicado quando você consegue essa liberdade, mesmo que seja isolado com pessoas que você nunca viu na vida, e aí vem uma pessoa e tenta te podar, seja por falas, ou se levantar na hora que você chega perto ou tentar te cortar de algum jeito. O Rodolffo se irrita muito com esse jeito escandaloso do Gilberto, ele acha que o Gilberto faz isso para se aparecer, mas o Gilberto realmente é isso e tá podendo ser isso só agora, e ele tá muito feliz com esse jeito dele. Ele tá sendo realmente ele, na forma mais pura, e eu inclusive tô amando assistir isso. 

A homofobia do Rodolffo já chegou a atingir pessoas que não são gays. O Fiuk acabou levando um comentário atravessado dele por querer usar vestido. Vestido não é uma roupa de homem nem de mulher, é só um pedaço de tecido em retângulo que foi juntado nas laterais. E o Rodolffo acabou fazendo um comentário tipo ‘como que leva esse menino de vestido para as boates de Goiânia?’ e aí obviamente vai chegar o comentário de uma pessoa ‘ah, mas o Rodolffo vem de uma outra família, uma outra formação, ele veio de Goiânia”. É meio doido porque as pessoas acham que LGBTs foram paridos pela Silvetty Montilla no meio da parada LGBT e não é assim [ri]. 

O Rodolffo é uma pessoa com muito dinheiro, não sei se milionário, mas sabemos como o dinheiro circula muito bem no meio do sertanejo. Sertanejos lotam muitos shows e aí entramos para um outro lado, que é o Rodolffo ser desse núcleo sertanejo que estava fortemente apoiando Bolsonaro desde a sua eleição e tem vídeo disso, falando que o voto dele era no Bolsonaro e se encontrando [promovendo aglomerações] nessa pandemia, né? Ele entra nessa onda com a galera negacionista, que é a favor de shows. Eu sou cem por cento a favor da cultura e da arte, mas entendo que não é o momento para fazer show. Não tem como fazer show. Se tivesse algum jeito, alguma forma que não fosse cafona e não comprometesse a saúde das pessoas a gente estaria fazendo, mas não tem como. Ele foi rastejando para conseguir de algumas formas montar shows e tem varias notícias dele falando que [o que estava fazendo] era um show com redução de 40% de pessoas, show com distanciamento, o famoso ‘seguindo todos os protocolos’, aí você vai ver a foto do show não tem um protocolo sendo seguido. É um amontoado de pessoas, uma aglomeração no local. Tem fotos disso em todo lugar e essa galera do sertanejo nunca é cobrada, nem pedido o posicionamento porque o núcleo deles não liga para isso. A gente tem que ficar muito atento.

A Sarah é uma pessoa que debochou da pandemia e que aglomerou também mas o Rodolffo não é cobrado sobre isso. E ele fez e aconteceu muitas e muitas vezes. Tem foto disso, tem vídeo, tem notícia em portal, no R7, na Contigo, várias e várias [matérias] sobre as festas que ele fez. Ele já falou até dentro da casa que ele tava com sintomas quando ele organizou uma festinha.

Eu sinto que se você é homem, branco, hétero, cis gênero tudo vai ser passado de canto. Ninguém vai ligar se você é homofóbico, se você aglomerou, se você é negacionista. Ninguém vai ligar para nada. As pessoas estão pouco se fodendo. Você tem meio que uma carta para poder passar por cima disso tudo e é por isso que eu sou realmente fora Rodolffo nesse paredão.

De resto tenha coisa mais importante pra fazer da minha vida, né?[ri]”

Leia a entrevista que o Eduardo, criador da drag Duda Dello Russo, deu para a Casa 1 aqui.

Foto de capa: Reprodução

Precisamos falar de Elliot Page na capa da Revista TIMES

Por Cyro Morais, produtor de conteúdo freelancer da Casa 1 

Quantos homens trans ou trans masculinos você conhece? Muitos? Quantos deles são famosos? Quantos tem fama internacional? Quantos foram capa de algum periódico de grande visibilidade no mundo? Pois é, é por isso que precisamos falar do ator Elliot Page na capa de uma das edições da revista TIME deste mês. 

Uma das mais conhecidas revistas semanais de notícia do mundo, a revista TIME surgiu em março de 1923, nos Estados Unidos. Em seus 98 anos de existência, a revista ganhou o mundo. Criou uma edição europeia, que é publicada em Londres e cobre Oriente Médio, África e América Latina. Outra versão editada em Hong Kong cuja cobertura engloba os países da Ásia, e outra, canadense, editada em Toronto. 

As capas da Time já estamparam diversas personalidades. De Michael Jackson a Mahatma Gandhi. De Hitler a Martin Luther King. Angela Merkel, Obama e até Trump, que foi capa da revista com o título “Presidente de uma América Dividida”. Mesmo com toda essa pluralidade, as pessoas que estampam a frente do periódico tem sempre algo em comum: visibilidade no que fazem.  

Com Elliot Page não é diferente. Aos 34 anos, seu talento é inquestionável. Ele já esteve no elenco de filmes de sucesso, como Inception, X-men e Juno. Mais recentemente, ele participou da série crônicas de São Francisco, que contava no enredo com vários personagens transgêneros. As gravações, no entanto, aconteceram antes do anúncio que fez em dezembro no seu perfil do instagram, dos pronomes ele e dele, pelos quais gostaria de ser tratado. 

À revista, Page disse que as reações ao seu comunicado foram dentro das expectativas.“O que eu esperava era muito apoio e amor e uma enorme quantidade de ódio e transfobia”, diz ele. “Isso é essencialmente o que aconteceu.” 

O que ele, talvez, não esperasse era a proporção que a história tomaria: ficou no topo dos trending topics do twitter em 20 países. Na entrevista, Elliot falou sobre carreira, fama e sua luta pelos direitos das pessoas trans. 

“Estou muito animado para atuar, agora que estou nesse corpo”, disse ele, que também relatou para a repórter Katy Steinmetz da lembrança de ‘um sentimento de vitória’, que teve ao cortar o cabelo curto, aos nove anos, e, pela primeira vez, ser percebido por estranhos como um garoto. “Eu queria ser um menino. Eu perguntava a minha mãe se um dia eu poderia ser”, disse ele durante a entrevista. 

Elliot Page não é a primeira pessoa trans a estampar a capa da Time. Em 2014, a atriz negra Laverne Cox foi a primeira mulher trans a sair na capa da revista. De lá pra cá muito se avançou no reconhecimento e na visibilidade das pessoas trans. O sucesso de séries com Pose e Veneno são prova disso. Ao mesmo tempo, muitas coisas ainda tem o que avançar. A triste marca de país que mais mata pessoas trans no mundo não deixa, nós brasileiros, sonharmos muito alto. 

O título que acompanha a foto de Elliot na capa dessa edição histórica traz uma frase do próprio ator “I am fully who I am”, ou em tradução livre “Eu sou completamente quem eu sou”. Mais do que uma frase de efeito, essa fala diz muito. Em um mundo dominado por padrões que matam pessoas como ele, a revista traz um Page, que mesmo tendo as benesses de ser um ator mundialmente famoso, está ali, humano, contando sua história sem fetichizações diante de todos. Criando imaginários possíveis. 

A matéria sobre Elliot Page na Times é histórica e super importante. Mas sua importância não reside apenas na sua realização e, muito mais em para onde ela aponta, para que horizonte nos faz olhar. Que outros homens trans e trans masculinos deveriam estar nas capas do mundo inteiro? Quantos outros tão talentosos quanto ele ainda estão incógnitos? Se ainda não sabe, procure saber. É aí que reside a mudança. 

Foto de Capa: Reprodução

Estudo inédito detalha os custos da guerra às drogas em RJ e SP

Somente nesses dois estados, em 2017, o investimento na guerra às drogas foi superior a 5 bilhões de reais; para Renata Neder, coordenadora do CESeC, a ideia da pesquisa é gerar o debate do “por que se investe tanto em uma política ineficiente e que causa dor e sofrimento?”

Por Caê Vasconcelos

Quanto custa proibir? Essa é a resposta que o CESeC (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania) respondeu na primeira fase da pesquisa inédita “Um tiro no pé: Impactos da proibição das drogas no orçamento do sistema de justiça criminal do Rio de Janeiro e São Paulo”, lançada nesta segunda (29/3).

Quem encabeçou a pesquisa foi Renata Neder, coordenadora do CESeC, formada em Geografia pela Universidade Federal Fluminense, com especialização em Planejamento Urbano e Regional pelo Instituto de Pesquisa e Planejamento Urbano e Regional da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A ideia, porém, surgiu do trabalho da socióloga Julita Lemgruber, especialista em segurança pública, ex-diretora do Departamento do Sistema Penitenciário do Rio de Janeiro, entre 1991 e 1994, e ouvidora da polícia no Rio, entre 1999 e 2000. “Com o passar do tempo ela percebeu que é impossível falar de política de segurança pública ou de uma outra política pública sem falar de política de drogas”, aponta Renata.

Acesse a pesquisa completa

Nas 64 páginas do relatório, o CESeC destrinchou o cálculo do custo, em valores reais, da proibição das drogas, segurança pública e justiça criminal (composto por Polícia Militar, Polícia Civil, Defensoria Pública, Ministério Público, Tribunal de Justiça, Sistema Penitenciário e Socioeducativo) no Rio de Janeiro e em São Paulo no ano de 2017, mostrando como essa política impacta na vida dos moradores de favelas e periferias.

O projeto também destrincha o racismo estrutural por trás da guerra às drogas e o quanto essa é a face mais violenta da proibição. Entre 2015 e 2019, de acordo com a pesquisa, o Rio de Janeiro gastou uma média anual de 15 bilhões de reais com o sistema de justiça. Já São Paulo, teve um gasto médio por ano de 44 bilhões de reais.

Fonte: CESeC

Em 2017, o maior investimento, nos dois estados, foi na Polícia Militar. No Rio de Janeiro o número foi equivalente a 32,33% do orçamento total, com quase 5 bilhões de reais, e em São Paulo o investimento correspondeu a 36,3% do orçamento, cerca de 16 bilhões de reais.

Um dos maiores desafios do projeto, conta Renata, foi obter os dados do estado. “Nos deparamos com duas ordens de problema: falta de transparência de instituições que tinham o dado, produzem o dado, mas demoraram um ano para responder. É uma verdadeira batalha. Também tem um problema de outra ordem que algumas instituições não produzem dados ou não produzem dados de qualidade”.

Fonte:CESeC

O montante gasto nos estados de Rio de Janeiro e São Paulo, em 2017, para manter a proibição das drogas é impressionante: 5,2 bilhões. Só em São Paulo foram gastos 4 bilhões de reais.

Para se ter uma ideia, com o bilhão investido no Rio de Janeiro para essa política, seria possível custear a educação de 252 mil alunos do ensino médio, construir 121 escolas para mais de 77 mil alunos, custear um ano inteiro de ensino para 32 mil alunos na UERJ, e beneficiar 145 mil famílias por um ano em programas de renda básica, além de comprar 36 milhões de doses da vacina AstraZeneca, suficientes para vacinar 18 milhões de pessoas contra a Covid-19.

Em São Paulo, com os 4 bilhões de reais, seria possível custear a educação de 840 mil alunos em escolas estaduais de ensino médio e a educação de 43 mil alunos na USP, construir 462 novas escolas, beneficiar 583 mil famílias por um ano com um programa de renda básica e comprar 72 milhões de doses da vacina Coronavac, suficientes para vacinar 36 milhões de pessoas contra a Covid-19.

Para Renata, o Estado ainda insiste nesse modelo de guerra às drogas, “que é um modelo de política que não reduz o consumo e o comércio de drogas ilícitas, não reduz a violência”.

“Pelo contrário, alimenta a violência e a corrupção dos agentes do Estado e o encarceramento em massa, além de inúmeras violações de direitos humanos em decorrência dessa política de guerra. O debate que estamos propondo é: por que se investe tanto em uma política ineficiente e que causa dor e sofrimento?”, questiona.

Leia a entrevista:

Ponte – Como surgiu a ideia de fazer a pesquisa com o foco no orçamento gasto na política de guerra às drogas?

Renata Neder – O projeto “Drogas: Quanto custa proibir” foi implementado pelo CESeC, que tem mais de 20 anos de experiência de pesquisas de segurança pública e justiça criminal, e é um projeto coordenado pela Julita Lemgruber, que tem mais de 40 anos de experiência nessa área.

A ideia do estudo vem do resultado da trajetória da própria Julita. Com o passar do tempo ela percebeu que é impossível falar de política de segurança pública ou de uma outra política pública sem falar de política de drogas.

É um estudo inédito no Brasil. Tem muitos estudos que mostram os impactos em termos de violações de direitos humanos da atual de política de guerra às drogas e do proibicionismo, mas não tem nenhum estudo que mostre quando isso custa aos cofres públicos.

Então o CESeC e a Julita identificaram essa lacuna e decidiram iniciar esse projeto que vai justamente pesquisar o custo orçamentário da proibição das drogas para diversas políticas. O primeiro relatório é para o custo de instituições de justiça criminal, mas depois vamos ter outras pesquisas olhando para os custos de educação e saúde. Esse projeto e esse relatório buscam suprir essa lacuna e propor um debate para a sociedade brasileira.

Ponte – Qual a discussão que pretendiam gerar na sociedade com a pesquisa?

Renata – O que queremos debater é quando custa, afinal de contas, para os cofres públicos essa política proibicionista e de guerra às drogas. Em segundo lugar porque se investe tanto em uma política que não só é ineficiente para os objetivos que ela mesma se propõe, mas além disso causa tanta dor e sofrimento.

Precisamos discutir porque se insiste nesse modelo de guerra às drogas, que é um modelo de política que não reduz o consumo e o comércio de drogas ilícitas, não reduz a violência, pelo contrário, alimenta a violência e a corrupção dos agentes do Estado e o encarceramento em massa, além de inúmeras violações de direitos humanos em decorrência dessa política de guerra. O debate que estamos propondo é: por que se investe tanto em uma política ineficiente e que causa dor e sofrimento?

A ideia foi fazer um comparativo do que significa esse recurso, porque quando falamos em valores muito altos, perdemos a dimensão do que isso significa na prática. Quando colocamos no relatório que o RJ e SP gastaram 5,2 bilhões com políticas de proibição das drogas, isso é muito ou pouco? Aí tivemos a ideia de fazer alguns comparativos do que isso significa.

Ponte – E esses recursos poderiam ser investidos em outras áreas…

Renata – Essa política de guerra está drenando recursos que poderiam ser investidos em programas de renda básica, na educação de adolescente ou adultos, políticas de moradia. É para a sociedade entender que são recursos que estão sendo drenados para uma política ineficiente e que tem enormes violações de direitos humanos, mas que poderiam estar sendo investidos em outras áreas.

No fim das contas queremos iniciar esse debate sobre o uso de recursos públicos em uma política tão nefasta quando a guerra às drogas. Política pública deveria ser feita, planejada e implementada com base em evidências. Precisamos exigir que a política de segurança seja assim e não em preconceitos e valores morais.

Existem muito estudos sobre o que funciona e o que não funciona sobre segurança pública, de prevenção de violência, de investigação de homicídios e do impacto nefasto da guerra às drogas em particular contra jovens negros e moradores de favelas e periferias. No entanto, essas evidências não são levadas em consideração no planejamento e na execução de políticas públicas.

O segundo ponto é transparência no acesso a dados e produção de dados para poder debater políticas públicas baseadas em evidências, que tem a ver com produção de informação, monitoramento de indicadores, monitoramento dos impactos das políticas. E uma coisa que nos deparamos durante o relatório foi a dificuldade do acesso aos dados.

Ponte – Até via Lei de Acesso à Informação?

Renata – Apesar do Brasil ter uma Lei de Acesso à Informação, que é um marco muito importante, nos deparamos com duas ordens de problema: falta de transparência de instituições que tinham o dado, produzem o dado, mas demoraram um ano para responder. É uma verdadeira batalha. Também tem um problema de outra ordem que algumas instituições não produzem dados ou não produzem dados de qualidade.

Embora não tenha sido um objetivo do projeto, discutir a transparência e qualidade dos dados, o processo da pesquisa mostrou que isso é muito deficiente no Brasil. Temos muito ainda para avançar na sistematização e disponibilização de dados de qualidade e isso impacta diretamente a discussão sobre políticas públicas. Se você não tem informações de qualidade, como você vai dizer que uma política funciona ou não funciona?

O terceiro ponto é participação nas decisões sobre orçamento público. Esse é um ponto central. A discussão sobre orçamento, no debate público, às vezes está muito pautada pela questão da redução dos gastos. Não paramos de ver, principalmente atualmente, discussão dos governos sobre a necessidade de cortas gastos e colocar teto nos gastos de saúde e educação. Quando na verdade o debate de orçamento público é muito maior, o ciclo completo do orçamento: precisamos discutir receita, arrecadação e quanto e onde se investe.

A discussão deve ser: por que neste modelo de política, por que esse discurso segue financiando esse modelo proibicionista e de guerra às drogas em vez de financiar uma política de segurança que seja baseada na redução e investigação de homicídios, na prevenção e não na ostensividade. Mas o que nós vemos é um investimento cada vez maior no modelo de guerra e isso é feito em nome da chamada guerra às drogas, que não tem efeito na redução e tem um impacto enorme na vida das pessoas.

Ponte – E na guerra às drogas, principalmente no Rio de Janeiro, vemos uma criminalização do morador de favela.

Renata – Uma operação policial no Rio de Janeiro, com helicóptero atirando do alto, não só deixa de desmontar uma rede criminosa, como gera uma ruptura no cotidiano daquele território.

São horas de tiroteio em que a escola fica fechada, os postos de saúde ficam fechados, os trabalhadores não podem sair de casa para trabalhar. Tem um impacto muito além da segurança pública que é a violação de outros direitos em decorrência desse modelo de guerra.

Ponte – E quem ganha com isso?

Renata – Ninguém ganha, mas na verdade alguém lucra. No ponto de vista do ganho social? Ninguém. Mas alguém está lucrando com essa política. E essa é uma pergunta que precisa ser feita.

Se já temos evidências suficientes e tempo de experiência suficiente, porque é uma política que já tem 20 anos, para mostrar que não é uma política eficiente para reduzir o consumo e o comércio de drogas e tem um impacto enorme na violação de direitos humanos que alimenta a violência e a corrupção dos agentes do Estado, porque se insiste em financiá-la?

Foto de Capa: Ilustração: Laerte para CESeC

Violência online dificulta representatividade das mulheres na política

MonitorA lança relatório no qual reúne análises e sugestões para o combate à violência política de gênero no país

Por Bárbara LibórioJamile SantanaFernanda Martins e Mariana Valente, do Internet Lab

Durante as eleições municipais de 2020, a violência política direcionada às mulheres foi marcante nas redes sociais. O cenário se constituiu por ameaças, discursos de incitação à violência e ódio, desmerecimento intelectual, críticas a seus corpos, idade e pertencimento étnico-racial,  e, quanto às mulheres trans, negação de sua identidade de gênero. Esses ataques foram identificados pelo MonitorA, uma parceria da Revista AzMina e do InternetLab, que acompanhou, de setembro a novembro de 2020, as redes sociais (Twitter, Instagram e YouTube)  de 175 candidaturas, homens e mulheres, para cargos de vereança, vice-prefeituras e prefeituras. 

O estudo apontou que, em comparação aos homens, elas foram atacadas por aquilo que são – mulheres, negras, idosas, trans -, enquanto os candidatos que receberam ataques foram ofendidos majoritariamente  por suas atuações profissionais, como políticos e gestores públicos – com exceção de idosos e GBT+, que também foram alvo de ódio e agressões por essas características. 

Ao considerar a baixa representatividade feminina nos cargos legislativos e executivos do país, somada aos atos discursivos violentos direcionados às mulheres que buscam entrar na vida política ou permanecer nela, fica claro que não é possível melhorar a representação feminina nesses espaços se não houver condições para que as mulheres disputem as eleições e permaneçam em seus cargos sem temer por suas vidas, ou lidar com as consequências desse tipo de violência para a saúde psicológica. 

É fato que há uma lacuna significativa na legislação eleitoral e ordinária em vigor para lidar com o problema. Assim como é fato que as soluções exigem a construção de esforços  que envolvem diferentes atores e setores sociais: os poderes executivo, legislativo e judiciário, mas também as plataformas de redes sociais – tendo em vista que o ambiente online é uma oportunidade para que esses ataques ocorram e se espalhem – e a sociedade civil. 

Durante os últimos meses de 2020, o MonitorA se concentrou em capturar e analisar os dados da violência política de gênero nas redes sociais e a publicar seus principais achados instantâneos. Agora, reunimos todas essas análises em um relatório que se propõe não apenas a comunicar os problemas encontrados, mas também a colaborar com sugestões que amplificam o debate em diferentes esferas. 

Clique aqui e confira a versão em português.

Para a versão em inglêsclique aqui.

Irmãs de Pau: “Nós não somos irmãs de paz”

Com o financiamento coletivo para o primeiro EP “Dotadas” chegando ao fim esse final de semana, Isma e Vita começarão a divulgação com uma grande oportunidade: hoje, elas serão uma das apresentações do Festival Bixanagô, com o pocket show “Atravecamentos”, que acontece às 20h, no canal do festival no Youtube.

Isma e Vita, as Irmãs de Pau, se conheceram dentro de uma ocupação secundarista em uma escola de Barueri: ” A gente fazia parte de um coletivo, de pessoas trans e periféricas sobretudo, e tinha contato com várias manas de outras escolas. Quando chegou esse projeto de reorganização escolar proposto pelo Alckmin, a gente se organizou para ocupar as escolas de Barueri e passamos dois meses em ocupação” conta Vita. Além de ataques policiais, a ocupação também recebeu ataques da comunidade por ser majoritariamente LGBT+, com maioria trans.

Apesar dos empecilhos, conseguiram realizar muitos debates sobre educação e reflexão sobre seus corpos.

“A gente conseguiu ser quem a gente era dentro da ocupação 24 horas por dia. Viemos de um contexto de igreja católica e evangélica e, às vezes, a gente só conseguia ser Isma e Vita nos rolês. Quando voltava [para casa] já tinha que performar o que os nossos pais esperavam de nós. Eu já era Vita, mas tava em um processo muito recente”.

Isma complementa a importância dessa convivência na ocupação: “Eu nunca tive um tempo tão grande usando roupas que eu queria e gesticulando da forma que eu queria […] Não era travesti ainda, mas já conhecia a Vita pelo coletivo, na ocupação ficamos muito juntas e viramos irmãs”. Isma achou “incrível” que os pais de Vita não sabiam que ela era travesti, e foi nesse momento que ela entendeu que para ser travesti, não precisava de autorização.

Isma Almeida é multiartista, trabalha com dança, música, DJ, produção cultural entre outras linguagens e está se formando em Pedagogia. É a idealizadora do Baile da Cuceta e artista das faixas “Travesti Maconheira” e “Vem Fud*”, que conta com mais de 7 mil visualizações no YouTube.

Vita Pereira coleciona mais de 25 prêmios no cinema e participou mais de 70 festivais internacionais e nacionais com obras celebradas como “Perifericu” (2020) e “Picumã”(2019). A artista também é formada em Pedagogia.

Apesar delas estarem se apresentando agora pela primeira vez como dupla, ambas já trabalhavam solo em outros projetos e essa não é a primeira vez delas no palco.

Acostumadas com a troca com o público, gravar o show em um contexto pandêmico, foi um processo muito diferente: ” Estamos fora dos palcos há um ano e meio. […] A gente sempre foi desse calor, dessa troca com as pessoas. Eu tenho muito saudade do palco. Saudade de ver gente sem máscara. Ver bocas. Eu nunca pensei que ver boca e nariz me faria falta. Uma coisa nada a ver, sabe?”, ri Vita.

O pocket show “Atravecamentos” traz “Travequeiro” primeiro single da dupla e outros trabalhos individuais. A oportunidade caiu perfeitamente no momento e as duas foram selecionadas pela curadora do evento Jup do Bairro, que não precisa de apresentações.

A edição de 2021 do BixaNagô – Empoderamento e Estética Negra, será a primeira apresentação da dupla, um grande marco carreira ainda iniciante: “A gente vê que artistas independentes começam com shows pequenos, em festas pequenas e a gente já começou com um show foda, agarramos com todas as forças essa oportunidade e ‘vamo que vamo'”, diz Vita.

“A gente tava sem expectativa de fazer isso tão cedo e estar do lado de artistas que admiramos há muito tempo. Vimos o edital e olhamos o critério e pensamos ‘não conseguimos fazer esse bafo’ e acabou que eles procuraram a gente”, relata Isma. Esse conteúdo vai ser essencial para a divulgação da dupla nas redes sociais até a chegada do EP.

O material audiovisual feito no show é essencial para elas, já que não conseguiram editais e não contam com grandes patrocínios: “A gente tem várias criminalizações. A primeira é o funk. Hoje em dia tem mega operação pela prisão de MCs, alegam que eles recebem dinheiro do tráfico, mas a gente sabe que essa perseguição é histórica com a produção de pessoas negras. Teve a capoeira, o samba e agora com o funk. Nós somos travestis negras e isso piora o quadro. Nós não somos travestis dispostas a falar de coisas que vão deixar os ouvidos confortáveis. Nós somos irmãs de pau, não irmãs de paz”, brinca Vita.

Ela também questiona a questão da visibilidade e diz que busca “vivibilidade”.

“Estar viva, ter condições estruturais, materiais, financeiras, psicológicas para manter nosso trabalho que também é falar sobre Brasil, sobre memória e sobre as possibilidades de ser travesti. A gente veio da academia, tem muito essa questão da gente [travestis] ser objeto de pesquisa sobre teses e nesse processo, nós somos sujeitas. Queremos falar sem papas na língua. […] A gente não tá disposta a negociar a nossa vida para entrar em alguns espaços”, pontua.

Isma diz que já sabia que não seria fácil chegar no valor total da Vakinha, mas que isso não vai fazer com que elas desistam: “A gente não vai desistir, não vamos abrir mão da gente. A gente sabe que vai acontecer de alguma forma. Tem uma galera que tá apoiando e tá fechando com a gente e se agarra nisso […] Eu estou muito cansada, queria ver meu Instagram limpo porque é um pouco humilhante também você estar na internet pedindo dinheiro”.

Vita concorda e complementa o pensamento da amiga: “É [importante] entender a precarização [causada por] esse governo que a gente vive hoje, é um reflexo disso. Se a gente tivesse editais, apoio estrutural de políticas públicas para financiar, sobretudo essa galera do funk da periferia. Tem editais, mas não chegam nessas pessoas por elas não terem CNPJ e outras diversas burocracias”.

As referências para o EP vêm da própria história delas, como o single “Travequeiro“, que segundo Vita, sempre aparece na vida delas: “Às vezes caímos na cilada do travequeiro. A novela é a mesma, só o muda o corpo da travesti e o lugar que ela tá. […] Quando falamos que estamos falando de afeto nessa música algumas pessoas dão risada. São afetos e desafetos porque a gente vem de um lugar muito carente. Precisamos construir nossa própria afetividade. […] Os travequeiros são os famosos curiosos que zoam as travestis com os amigos mas, sozinho, vai no aplicativo procurar a gente. O Brasil é o país que mais mata travestis e também é o país que mais pesquisa pornografia trans no mundo. É um desejo muito forte mas permanece nas esquinas, na noite, no quarto. Não é um desejo que eles têm vontade de tornar público. Quando a gente joga com isso é jogar esse desejo pro público e falar sobre essa construção do desejo no imaginário social de como travestis devem ser amadas e receber migalhas. Eu quero sentar na mesa e comer a entrada, prato principal e a sobremesa. Eu não quero as migalhas”.

Isma continua: “Eu acho que a gente pode transformar isso, pode existir um travequeiro que tenha orgulho de ser travequeiro mesmo. […] Gostaria que eles se orgulhassem e fossem aquele que levam pra um restaurante, pra família e põe uma aliança no dedo. Que enxergue possibilidades além de só uma transa”.

A dupla também enfrentou resistência entre mulheres trans: “A Linn Da Quebrada tem uma música que fala isso e na época ela foi muito atacada por LGBTs no geral, então a gente já sabia que também seria. Algumas pessoas falaram que era nada a ver chamar mulher de pau porque existem pessoas trans com disforia. Nós somos travestis e não temos problemas com a nossa genitália. As pessoas estão acostumadas com uma única representação e esperam que essa pessoa fale por todas. Nossas histórias também precisam ser valorizadas e contadas e vai ser por nós mesmas. Nesse EP falamos sobre a realidade de Vita e Isma. A gente não tá disposta a falar sobre todas porque a gente não vive todas as realidades. […] Tem outras funkeiras travestis que não falam sobre se dar bem com a própria genitália e aí nos enquadraram como falocêntricas. É errado falar isso. A gente está em um processo de auto amor e auto cuidado. As pessoas olham para a gente na rua e vão primeiro na barba e na genitália. Temos marcadores sociais, olhares de auto ódio que fazem com que a gente se sinta mal. Estamos falando sobre aceitar e amar o corpo que a gente tem”, pontua Vita.

Isma se incomoda muito com questionamentos sobre sua genitália e sobre tentativas de tentarem negar sua existência enquanto mulher trans: “Eu acho riquíssimo falar sobre travestis que não tem problema com o pau e que são felizes. As pessoas se perdem muito nessa coisa de representatividade e acreditam que uma pessoa vai representar todas as travestis e isso é um problema enorme. Só mantém estereótipos. A ideia é mostrar que somos plurais”.

Vita traz um outro questionamento para o debate.

“As pessoas têm um vício de dicionário, sabe? Travesti tem que ter um significado e se você não está nesse conceito, você não é travesti Muitas pessoas acham que mulher trans é aquela que quer a redesignação sexual e travesti é aquela que não quer. A quem interessa essas distinções? Quando a gente recebe críticas, principalmente vindo de pessoas trans sobre o nosso trabalho, é para provocar esse debate. Não somos iguais”.

Agora com o fim da divulgação da Vakinha, a dupla se prepara para gravar as músicas que faltam e produzir um novo clipe e Vita espera contruir em coletividade um novo cenário: “O EP ‘Dotadas’ não é no sentido de genitália, mas de grandeza e possibilidades. E impossibilidades também como o pouco dinheiro.” Mesmo com metade do valor arrecadado até o momento (é possível doar até domingo por esse link ou diretamente pelo PIX da Isma: 460.980.358-57), agora elas estão muito ansiosas para a produção do EP e já planejam o possível lançamento de um álbum: “Eu percebo que as pessoas criaram um afeto pela gente e, como diz a Jup, precisamos transformar em uma coisa efetiva. Não basta amar e achar tudo maravilhoso, é ajudar acontecer de forma real”, finaliza isma.

Levante Feminista Contra o Feminicídio lança campanha nacional

A lei que tipifica o assassinato de mulheres em decorrência do seu gênero – feminicídio, foi criada em 2015 mas, infelizmente, os casos não param de crescer no Brasil. Diante desse cenário assustador e desesperançoso, mulheres de todo o país se uniram para formar o “Levante Feminista Contra o Feminicídio” uma frente suprapartidária que lançou nessa quinta-feira uma campanha nacional contra o assassinato de mulheres. 

No primeiro semestre de 2020, segundo dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, o assassinato de mulheres cresceu 26%. A pandemia deixou as mulheres ainda mais vulneráveis: em 2020, o país registrou uma denúncia de violência contra a mulher a cada cinco minutos. Foi esse aumento nos dados que fez mulheres de diferentes grupos sociais se unirem para pensar juntas uma frente única contra o feminicídio no país. Entre elas estão a filósofa Marcia Tiburi, a pesquisadora e assistente social Tania Palma e também a socióloga Vilma Reis, integrante do Coletivo Mahin.

Hoje, com quase 200 participantes do Brasil inteiro que se articulam de maneira remota para construir uma ação conjunta pela vida de todas as mulheres. No dia 12 de março, o grupo lançou um manifesto, construído coletivamente, que já tem 25 mil assinaturas. 

O manifesto faz parte do movimento “Nem Pense Em Me Matar” e se apoia na afirmação que “quem mata uma mulher, mata uma humanidade”. A mobilização denuncia a omissão do Estado e exige proteção à vida das brasileiras. 

O movimento Levante pretende atuar, dentro dos próximos anos, em conjunto com mobilizações sociais e cobrar ações dos poderes públicos contra violências e assassinatos de mulheres. A campanha “Nem Pense em Me Matar” contará também com ações pontuais em cada estado, organizadas por mulheres que conhecem a realidade de cada lugar.

Clique aqui para assinar o manifesto ou contribuir na Vakinha.  

Foto de capa: Divulgação

Coletiva Travas da Sul lança campanha de financiamento coletivo para compra de cestas básicas

Travas da Sul é uma coletiva de organização social criada por e para pessoas LGBTQIA+ com protagonismo transvestigênere. Atuamos nos distritos de Grajaú e Parelheiros (São Paulo) mas atendemos a população LGBTQIA+ de outras regiões periféricas da cidade. Fomentamos ações voltadas à cultura, saúde, entretenimento, educação e economia colaborativa na periferia.

Com início das atividades em “Fervereiro” de 2019, nossa coletiva já realizou diversos saraus promovendo acesso à cultura LGBTQIA+ por meio de poesias, apresentações artísticas e performances.

A coletiva já promoveu festas com o nome “Diz_Trava”, oficinas, exibição de filmes, recebeu a Deputada Érica Malunguinho (PSOL) no calçadão do Centro Cultural Grajaú, e participações em eventos como lançamento da Frente Parlamentar em Defesa dos Direitos LGBTQIA+, em exposições e uma edição do Sarau Travas da Sul no SESC Pompéia.

Com a chegada da pandemia covid-19, entendemos nossa responsabilidade de ir além de ações artísticas.

A situação pandêmica se agrava uma vez que 90% da população de mulheres trans e travestis trabalham na prostituição. Apenas 4% da população transvestigênere trabalha formalmente. Com o isolamento social, grande parte da população não pôde mais trabalhar, nem mesmo nos trabalhos informais, sendo jogadas mais ainda em situação de vulnerabilidade social. Afim de garantir o mínimo, que é a alimentação, nossa coletiva tem se movimentado desde o começo de Abril de 2020 realizando ações de entrega de Kits de alimentação, higiene, limpeza e de redução de danos para essa população. Nossas ações dependeram e dependem da colaboração de pessoas e organizações parceiras, pois somos uma organização autônoma que no momento não tem nenhum apoio financeiro e nem recurso próprio. Até agora já foram distribuídas mais de 500 cestas básicas e para continuar com esse trabalho.

“Contamos com sua colaboração para nosso segundo financiamento coletivo! Nossa meta é arrecadar 10 mil reais para subsidiar a compra e distribuição de cerca de 150 cestas básicas!

Se não puder colaborar financeiramente, COMPARTILHE nossa vakinha com o máximo de pessoas possíveis, juntes chegamos mais longe e permanecemos fortes!

Colabore com nosso Abaca$shi ou fazendo uma transferência via PIX.

Nossa chave é: 39123985852 (Diogo Emanuel)”

Foto de Capa: Wallace Leray / Agência Mural